Um olhar mais atento sobre a adolescência.

Não poucas vezes vemos a adolescência como um período conturbado de nossas vidas, com mais aspectos negativos que positivos, e chegamos a denominar esta fase de “aborrescência”.

As características que parecem ser mais negativas do ponto de vista da adolescência justamente são as mais importantes para que o indivíduo se torne adulto. A perda da noção de tamanho corpóreo, a necessidade de correr risco, os aspectos contestatórios inerentes a esta fase são os pontos que mais entristecem e aborrecem os adultos.

O estirão do crescimento na adolescência não tem sua rapidez repetida na mente, o corpo cresce 10 a 20 cm em dois anos e fica 10 a 20 kg mais pesado, a mente continua com uma imagem do corpo antigo, de criança. Isto faz com que os adolescentes tenham suas maneiras desajeitadas de caminhar e se vestir, e provoca os desastres característicos na mesa do jantar. Logo após uma discussão mais séria com pais, os músculos tonificados de um braço que é maior do que o cérebro do adolescente imagina ser, faz com que o mesmo acabe por bater a porta, o que poderia significar uma afronta. Pais e professores podem considerar como tal, ou explicar isso a seus filhos e alunos, o que retira o caráter de afronta. Certa vez em aula tive que pedir para um aluno se retirar de sala por indisciplina, e na hora de fechar a porta ele bateu com força a mesma, imediatamente o aluno retornou e disse “desculpa professor, o senhor sabe né..”.

Durante a adolescência o cérebro perde em torno de 30% das sinapses (conexões entre células nervosas responsáveis pelas emoções, sensações, pensamento, linguagem) relacionadas ao prazer, isso devido ao fato de adolescentes terem de buscar novas estimulações para se tornarem adultos. Menos desta área, mais riscos, pois brincar de roda e pega pega não satisfaz mais as necessidades de prazer do cérebro e do corpo. É necessário sexo naquele lugar mais perigoso, de preferência sem camisinha, é necessário pular de bung jump, ou acelerar ao máximo no carro “emprestado” do papai. Este fato de busca por novas e culminantes experiências também está na origem das contestações dos adolescentes. Na necessidade de construção da sua visão de mundo o adolescente passa a negar a visão de mundo dos seus pais, dos seus professores e dos mais velhos.

Para o estabelecimento de boas relações com os adolescentes faz-se imprescindível diálogo aberto e franco (adolescentes adoram franqueza). Quando os pais se mostram parceiros não há necessidade de contestação, nem de afronta, pois o adolescente poderá construir sua visão de mundo de forma sadia e livre. Também na adolescência se estabelece o caminho para a especialização do cérebro, portanto, é necessário que o adolescente comece a ter tarefas e responsabilidades que o auxilie na sofisticação das áreas do cérebro relacionadas a memória de trabalho (sequência de tarefas), relacionada a empatia (capacidade de se colocar no lugar do outro) e outras oriundas de compromissos e tarefas que o adulto poderá delegar. Neste sentido, programas como o jovem aprendiz, os trabalhos voluntários e outros programas de inserção no mercado de trabalho, desde que não diminuam as capacidades e potencialidades acadêmicas, devem ser estimulados e ampliados em todas as esferas sociais.

Sou fã desta etapa do desenvolvimento, com suas novidades, suas dúvidas e vejo na necessidade de os adolescentes criarem suas próprias e inovadoras visões de mundo uma bela maneira de mudarmos os rumos do processo civilizatório. Afinal de contas, qual adulto esclarecido vai pressupor que estamos, enquanto humanidade, no caminho certo, com tantos problemas sociais, econômicos, demográficos e ambientais permeando nossas vidas? Parece-me emergencial o surgimento de uma nova visão de mundo, e nossos jovens são promissores na elaboração de tais visões.