O cérebro dos adolescentes é
configurado para buscar prazeres imediatos e a qualquer custo, impulsionando os
mesmos às novidades que propiciam a formação de uma mente e corpo adultos. Caso
contrário, não se interessaria por sexo e outras atividades próprias da
adultescência e da vida adulta. Docentes e educadores que trabalham diretamente
com esta faixa etária devem desenvolver estratégias pedagógicas que possam
oferecer novas abordagens que constituiriam uma nova visão de mundo, tão
desejada pelos jovens. Esta necessidade
de negação da visão do mundo adulta remonta a formação do cérebro adolescente
na pré história de nossas mentes. Neste período, quando meninos recomeçam a
produção de testosterona e passam a enfrentar os machos dominantes dos bandos
por acesso a recursos, fêmeas e sexo, e as meninas retomam a produção de
estrógenos e começam competir por recursos com as fêmeas dominantes, jovens de
ambos os sexos eram expulsos dos seus bandos de origem e formavam agrupamentos
de juvenis (as atuais tribos urbanas de jovens, por vezes, hordas inteiras nas
ruas de nossas cidades, são exemplos de comportamentos desta natureza). Nosso movimento
natural quando somos rejeitados por um grupo é de negação, do tipo, aqueles
caras não estão com nada, eles não sabem nada, estão atrasados, por fora, meu
pai é um careta, entre outras expressões usadas.
Podemos, na condição de adultos
educadores, gerar empatia, que é capacidade de se colocar no lugar do outro,
gerar uma teoria da mente do outro, sentir o que o outro sente, afinal, já passamos
todos por esta fase, a adolescência. Por outro lado, os adolescentes nunca
foram adultos e lhes é mais difícil se colocar no lugar de um adulto, na eterna
luta do tipo “meu filho, se coloque no meu lugar” e “ninguém me entende nesta
casa”.
Podemos e devemos pedagogicamente,
revestir os conteúdos, inclusive os clássicos, de uma roupagem
“revolucionária”, mostrar que o conteúdo ministrado pode ser usado para a mudança
da realidade do aluno. Neste sentido, os estudos sobre sistema digestório em
ciências e biologia podem ser aportes para mostrar que somos animais onívoros
(que nos alimentamos de todas as fontes de alimentos; vegetais, carnes, ovos),
mas que nossa dieta é baseada em apenas quatro grãos (trigo, soja, milho e
arroz) e que isso se fundamenta em aspectos mercantilistas, existindo outros
grãos mais nutritivos para nossa dieta atual, como por exemplo, linhaça,
centeio, quinoa, amaranto, a chia, e que seriam melhores para os ecossistemas (teríamos
a diminuição das áreas destinadas à monocultura, que provocam grandes problemas
ambientais, também os grãos andinos como a quinoa e amaranto, quando
cultivados, diminuem a produção de folha da coca e a produção de seus derivados
utilizados como drogas recreativas). Assim, transformamos um tema “careta” em um
assunto de “vanguarda” para nossos jovens.
A questão não é o professor se
comportar como adolescente, exceto se ele ainda o for, o que é comum e positivo
nas nossas licenciaturas, mas ele ainda pode ter uma mente jovem no sentido de
desejo de mudança. Alunos sempre desconfiarão, e com razão, de professores
muito desinibidos que tentam bancar o adolescente. É necessário mostrar como,
enquanto um ser que trabalha e gosta de conviver com jovens, tem ainda a
capacidade e desejo de mudança, pois entende que o mundo e sua visão pré
estipulada e forçada não é algo positivo para o futuro.
Também a literatura é fonte
inesgotável de abordagens revolucionárias e que propiciam novas visões de
mundo, as quais o adolescente está ávido por construir. Muito em voga estão os
livros escritos por autores de países com orientação islâmica, como O caçador
de pipas, de Khaled Husseini, que apresenta uma visão do governo totalitário do
Talibã, no Afeganistão (um mundo muito distinto de nossa cultura cristã no Brasil),
e que trabalha temáticas como a amizade, reconciliação, liberdade. Também o
livro Saturno nos trópicos, de Moacyr Scliar, que trabalha a melancolia do
ponto de vista da medicina e da história, de maneira rica e que apresenta as
origens da melancolia na Europa e como ela chega ao Brasil, bem como suas consequências
para a formação da identidade do povo brasileiro e trás a ideia muito debatida
por este autor de uma tristeza leve e positiva, produtiva, pois as pessoas que
apresentam uma visão mais apurada da realidade são os que oscilam entre levemente
tristes e levemente felizes e ainda uma crítica à patologização da vida e a
medicalização da existência. Ainda nesta linha temos grandes livros como Viva o
povo brasileiro, de Darcy Ribeiro, Casa grande e senzala, de Gilberto Freire. Os
textos de João Guimarães Rosa, como Manuelzão e Miguilin, que trabalha o tema
da morte na perspectiva de um homem de idade e de um menino.
Claro que o educador deve ter
sua própria lista de sugestões, mas fica aqui a importante ideia de não
formalismos nas abordagens de determinados aspectos e tópicos, que podem causar
repulsa ou descrença por parte do aluno ou aluna. Adolescentes adoram
franqueza, mas com pouca formalidade, e usar um texto para iniciar uma
discussão é um ótimo recurso. É mais fácil para pais e educadores fazerem uso
de um texto ou algo que saiu na mídia para propor uma temática do que iniciar a
mesma com jargões do tipo: “pessoal, precisamos ter uma conversa séria sobre
tal assunto”.
Podemos explicar a emergência
das tribos urbanas e dos grupos de jovens pela necessidade de formação de uma
nova visão de mundo e se sustenta na hipótese de formação dos agrupamentos
humanos primitivos de jovens, discutido anteriormente neste texto. Muitas
destas tribos urbanas apresentam posturas, vestimentas e linguagem próprias de
uma faceta do mundo dos adultos a qual querem se opor. Neste sentido, os hippies, na década de 1960, se
empenhavam na luta pela paz e o amor libertário, por uma vida livre do jugo do
consumismo, do capitalismo, que por sua vez era o grande gerador das guerras
(como a guerra da Coreia e do Vietnã, inclusive da Guerra Fria). Os punks que no
final dos anos 1970 e início dos anos 1980 eram opositores de uma visão de
mundo baseada no progresso e apresentavam uma total descrença pela melhoria do
ser humano. Os Emos (abreviação de Emotional Hardcore – ou emoções fortes) é
uma vertente que surge no início dos anos 1980 como uma afirmação mais sentimental
do punk. Estes jovens se opõem à banalização das emoções, valorizam
sentimentos, a sensibilidade extrema, além de serem muito tolerantes e
flexíveis em relação à sexualidade. A banalização das emoções e sentimentos, a
falta de tolerância com o diferente e os preconceitos são o que os EMOS buscam
se opor com o seu estilo de ser.
Muitos pais e professores se preocupam
com dois aspectos frequentemente presentes nessas tribos urbanas: a sexualidade
exercida de forma irresponsável e perigosa e o envolvimento com drogas. Estas
duas facetas podem fazer parte, vale ressaltar, não apenas do mundo das tribos
urbanas, mas do mundo dos adolescentes de maneira geral, por motivos discutidos
no capítulo anterior. O aspecto androgênico de muitos meninos e meninas (lembre-se
dos cabelos compridos dos meninos hippies da década de 1960) tem um correlato
muito forte com a indefinição da sexualidade próprios desta idade. Se não estão
ainda bem formadas as identidades corpóreas e sociais, quem dirá a identidade
sexual, tão revestida de tabus e preconceitos. O próprio docente muitas vezes
tem problemas em falar abertamente sobre sexualidade, pois ele mesmo apresenta
indefinições e preconceitos relacionados ao tema. Por outro lado, os adultos
não podem simplesmente dar valor positivo à formação de tais grupos, mas deve “emprestar”
seu cérebro amadurecido, para usar a expressão da Neurocientista Suzana
Herculano-Houzel (2005), e auxiliar o jovem nas suas tomadas de decisões e nas
posturas que assume.
Também a violência pode ser
vista como algo que vem dos adultos e que é imposta às crianças e adolescentes.
O tema é pertinente quando se fala em contestação e mudança de visão de mundo e
o educador pode apresentar uma postura revolucionária ao assumir papel de
pacifista e conciliador, colocando desde o primeiro dia de aula que o bullying
não é tolerado na escola sob hipótese e formato algum (Observatório da Infância,
2010).
O
educador deve se mostrar um aliado do aluno desde o inicio da relação,
demonstrando sua preocupação e disposição para tratar de assuntos que são de
interesse ou necessidades dos mesmos, ou no caso de crianças pequenas, mostrando-lhes
carinho e afeto. Não devemos nos posicionar como adolescentes, assumindo
posturas e comportamentos que não são os nossos (isso fica até ridículo sob os
olhares do aluno e o mesmo se questiona acerca das verdadeiras intenções por
trás do discurso adulto, não sem razão), mas sim, nos posicionando e
comportando como adultos resolvidos que também passaram pelas mesmas
transformações, e que não se acovardaram ou aceitaram de forma passiva o mundo
que lhes foi dado, ou seja, que também já fomos jovens e que ainda buscamos
nosso lugar ao sol. Isso gera sentimentos de empatia e todo o restante do
processo de ensino aprendizagem ficará facilitado, bem como a abertura para
solução de problemas em conjunto.
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